Quero escrever agora porque eu gosto do flamenco. Estou escutando Enrique Montoya. Montoya, Heredias, Camborio. (Si te llamaras Camborio hubieras hecho una fuente de sangre de cinco chorros). O soluço da guitarra tece os arabescos de um pátio árabe. E o llanto, o chorar, é o canto mais primitivo. Como unindo o que há de mais antigo? Como brogando da terra e na terra se fincando. Os bailarinos, bailaores, os cantaores, os guitarriscas, eu os conheço e são a sensibilidade bruta. Como adoro a sensibilidade bruta nos homens. Como também a adorava o Lorca, recolhendo cantes por andaluzia, em partituras e poesias. Aquele belíssimo tan solamente a la tierra... São os homens da terra, camponeses, aqueles da meseta, dos olivais, do rio guadalquivir. Aqueles que não tem as palavras todas do dicionário e da poesia e dos letrados. Os que só tem um coração, fininho e como um vulcão. O amor, a paixão, essa coisa terrível, como escreveu nas suas tristes cartas o meu querido Werther, é igual para todos os homens: os intelectuais e os de bruta sensibilidade. É da mesma forma tumultuoso. É da mesma forma tolo. E a paixão não correspondida é da mesma forma dolorida e intratável como uma gravíssima enfermidade que pode, talvez, nos consumir até a morte, independente de nossa vontade, de qualquer dos nossos esforços. O coração é igual e sente igual. Os meus homens rutos, como para exprimi-lo, para cantar dor tão pesada e, a um só tempo, querida, expõem seus peitos, com poucas palavras e suas muitas invenções e estranhas construções. Tão simples e tão sinceras. É seu encanto. Porque as palavras ditas assim, com o fogo, com o llanto ou com uma doce alegria: só pelo sol, pelo céu, os olivais, por uma mulher ou por uma luna, lunita buena; são como as primeiras palavras. Assim como o canto, chorado, monomelódico é como, sempre, o primeiro canto; o que dizem são, também, as primeiras palavras. As primeiras palavras de um homem. E só podem ser verdadeiras. A percussão também é ancestral e é o ritmo do organismo; é, na sua forma mais seca e mais resumida e mais certa, o tempo da paixão, do amor, da burla, da alegria; de tudo isso se misturando... Meus homens de amor bruto expõem à atmosfera seus corações palpitando. Eles devem ser protegidos de tudo, eu queria protegê-los, em um abraço de penas, do ar frio do mundo, da compreensão dos entendidos, das análises secas, das vozes altas e descuidadas, porque para um peito exposto, tudo é violência.
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Manu Ángel.
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